Como é viver no Artico
Ciência, G1 no Alasca11 de Julho de 2008 às 08:51
No fim da temporada no Alasca, respostas e as melhores imagens da aventura
Depois de duas semanas, nossa aventura no Alasca chega ao fim. Agora, o grupo de jornalistas que visitou a Estação de Pesquisas de Toolik Lake começa uma nova jornada: tentar voltar para casa.
Foi um período de intenso trabalho e muito apoio de vocês, leitores. Por isso, aproveito esta “despedida” para responder algumas das principais perguntas que recebemos neste blog. Intercaladas com as respostas, ficam também as melhores imagens desta temporada ártica.
Os jornalistas que participaram do curso passaram por um processo seletivo para ganhar uma bolsa de estudos e poder ficar por aqui essas duas semanas. O curso, que está em seu 23° ano, é oferecido pelo Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, um centro de pesquisas privado sem fins lucrativos que realiza estudos de biologia, biomedicina e ciências ambientais, financiado pela Fundação Nacional de Ciências dos Estados Unidos.
Agora, as respostas (e as fotos):
“Depois do jantar o que a equipe costuma fazer? Dormir? O que há de diversão na estação?” (Edson Oliveira Matos)
A estação tem diversas opções de diversão. Há uma cesta de basquete ao lado de um laboratório, mas sinceramente eu só vi os jornalistas usando aquilo. Há uma mesa de pebolim e uma de ping-pong e também uma televisão com videocassete (é) e algumas opções de filmes. Muitas pessoas costumam ler, há livros de ficção por todos os laboratórios.
As opções mais populares, no entanto, são escalar as montanhas da Cordilheira de Brooks e fazer música. As escaladas ocorrem principalmente aos domingos. A música, é claro, acontece com mais freqüência. Há uma guitarra, um baixo e uma bateria no acampamento e diversos alunos trazem seus próprios instrumentos. Todo mundo pode participar. As partituras estão anotadas no chão de uma das tendas reservadas para o lazer. Em geral, eles tocam músicas folk dos Estados Unidos, mas há um espacinho para os ritmos mais calientes sempre que há algum latino na área.
“Banho de dois minutos? Dá pra lavar o quê?” (Márcio)
Puxa, Márcio, dá pra lavar tudo! Juro! É só saber se organizar e usar a estratégia de não deixar a água correr à toa. É se molhar, desligar o chuveiro, ensaboar tudo e daí ligar de novo para enxagüar. É uma boa lição para quem quer economizar água!
“Quero saber se qualquer pessoa pode visitar o Alasca.” (Silvino Netto Junior)“Em questões turísticas? Como funciona? É necessário ter visto americano para entrar no Alasca?” (Diego Fronteck)
Sim, qualquer pessoa pode visitar o Alasca. Mas brasileiros precisam de um visto americano para entrar.
“Em um post anterior vocês falaram que no inverno permanecem apenas alguns cientistas no Alasca. Gostaria de saber o que eles fazem por aí no inverno, e se realmente o Sol nunca aparece neste período. Como é a vida inteiramente noturna?” (Cleiton Eduardo Saturno)
No Alasca como um todo permanece muita gente! Há grandes cidades por aqui. Na Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no entanto, pouquíssimas pessoas ficam – e o Sol nunca aparece. Durante todo o inverno passam cerca de 15 cientistas no total, mas dificilmente há mais que meia dúzia ao mesmo tempo. É nessa época que eles estudam o gelo e a aurora boreal. Há um laboratório e um dormitório específicos para a temporada de frio, com proteção extra. A locomoção é feita com trenós e há um abrigo para tempestades de neve.
“Gostaria de saber se é possível as pessoas que não são cientistas e nem jornalistas não só conhecerem a base, mas também participar de todo esse trabalho que vocês estão acompanhando.” (João Victor Marques)
Infelizmente, não. Toolik Lake é uma estação de pesquisas e visitantes não podem entrar aqui. Tanto que ela nem aparece nos mapas. Não é para ser chato, mas é que toda a área está repleta de experimentos científicos. Quem não conhece, pode achar que um pedacinho de vegetação não é nada demais e estragar um experimento de 20 anos.
O Alasca, no entanto, tem diversas belas áreas completamente abertas para visitação.
“Gostaria de saber a nacionalidade dos cientistas. Se são todos americanos.” (Grazielle)
A grande maioria é americana. Mas estrangeiros visitam o tempo todo. Nesta semana, tivemos um grupo vindo da Rússia. Já passaram por aqui suecos, canadenses, alemães e pessoas de outras nacionalidades, inclusive brasileiros.
“Acharam as colheres desaparecidas da estação de pesquisa?” (Carlos Ricardo Oliveira Felizardo)
Acharam algumas, Carlos. Mas os cartazes continuam espalhados pela estação, porque ainda são poucas.
“Gostaria de saber qual será a conseqüência do derretimento do oceano Ártico.” (Helder – Pt)
Excelente pergunta, Helder! Fizemos uma matéria sobre isso nesta semana. Confira!
“Os mosquitos picam? Ou eles somente enchem as paciências?” (Cristiane)
Picam, Cristiane. Picam, inclusive, através das roupas. E enchem a paciência, bastante.
“Se os mosquitos são em quantidade tão imensa e as pessoas que estão aí há mais tempo nem se preocupam mais em usar redes ou repelentes, gostaria de saber se eles oferecem algum risco à saúde. Não poderia ter uma epidemia de dengue aí no meio do Alasca?” (Jero)
Não, Jero. Apesar de chatos, os mosquitos do Alasca são completamente inofensivos. A dengue é uma doença tropical, que não chega aqui. O único mal causado pela picada do bicho é uma coceira danada – ainda bem!
“Como vocês conversam por aí? Os mosquitos fazem parte da dieta, como complemento de proteína?” (Márcio)
Nossa, Márcio, nem fale. Não existe ninguém por aqui que não tenha engolido uns mosquitos. Eu já almocei uns três ou quatro pelas minhas contas.
“Quanto tempo duram estes eventos: sol da meia-noite e dia polar?” (Maria Schaun)
A duração exata varia, mas o sol da meia-noite é visto durante quase todo o verão do Hemisfério Norte acima do Círculo Polar Ártico, de junho a meados de agosto. Da mesma maneira, a noite por 24 horas acontece durante quase todo o inverno, de dezembro a fevereiro.
“Como fazem para tomar banho?” (Barbara Muniz)
Como eu expliquei lá em cima, Barbara, é banho de dois minutos. Mas só pode duas vezes por semana. No intervalo, a gente se vira com a sauna. Se esquenta, daí sai e toma um “banho” de caneca, com água do lago. Quem tem mais coragem, se joga no lago mesmo.
“Eu queria que vocês tirassem uma dúvida que eu com meu amigo ficamos. Já que nesta época do ano não tem nem ‘raiar-do-Sol’ e nem ‘pôr-do-Sol’ imaginamos que a impressão que temos é que o Sol não passa ‘por cima de nossas cabeças’ e sim fica circulando ao nosso redor. Estamos certos?” (Lucas Augusto)
Mais ou menos, Lucas. O Sol passa por cima, sim. Ao meio dia ele está lá no topo. O que acontece é que, durante a madrugada, ele faz a volta, na linha do horizonte.Vocês estão certos, no entanto, ao dizer que ele faz um círculo no céu. É isso mesmo, direitinho.
“Qual é a temperatura mais baixa já registrada no inverno? E no verão qual é a temperatura?” (Vantuil N. de Carvalho)
O recorde de temperatura no Alasca como um todo no inverno é –64ºC. No verão, são impressionantes 38ºC. As duas temperaturas foram registradas no interior do estado, que tem as maiores variações.
“Os raios solares ficam com a mesma intensidade o tempo todo? Ou meio dia é mais quente do que o resto do dia?” (Priscila)
Meio dia é mais quente, sim, Priscila, porque o Sol está no topo e esquenta tudo. De manhã e à noite é um pouco mais frio, porque ele abaixa.
“Esses mosquitos aparecem no inverno?” (Antonio Tadeu Astolfi)
Não, Antonio, no inverno eles ficam quietinhos. É só no verão mesmo que eles enlouquecem a gente. Tanto que os animais da região costumam ir para perto da costa durante o verão, onde bate mais vento e tem menos mosquitos. No outono e na primavera eles já são em número bem menor.
“É muito caro passar uns dias no Alasca?” (Erica)
Depende, Erica. É preciso pagar a passagem de avião e, em geral, do Brasil, são precisos dois ou três vôos para chegar até aqui. Há hotéis nas cidades maiores, e os preços variam. No verão, a região fica lotada de turistas, logo, os preços sobem. Os mais aventureiros podem economizar acampando. Toda a área da Dalton Highway é do governo americano, e é permitido acampar em qualquer ponto (menos nas proximidades de Toolik Lake). Mas é vida selvagem mesmo, não há amenidades como banheiro e chuveiro por perto.
“Dá para se chegar de avião em Toolik Lake? Eu vi em uma das fotos, o que parece ser uma pista de pouso. É grande? Há aviões na estação? Qual a cidade mais próxima? Existe no Alasca cidades mais ao norte que a estação? A estrada que leva à estação leva a algum outro local ou cidade?” (Diego Rodrigues)
Por partes, Diego! Dá e não dá para chegar de avião em Toolik Lake. Há uma pequena pista de pouso, que não comporta nada mais que um aviãozinho daqueles de quatro lugares. Mas ela só é usada com agendamento e para pesquisadores. Não há aviões na estação, só um helicóptero, para uso em pesquisas e em emergências (que, felizmente, nunca aconteceram). A cidade mais próxima é Prudhoe Bay, ao norte, mas lá não tem muita coisa (veja aqui). A cidade com infraestrutura mais próxima é Fairbanks. A estrada liga apenas Prudhoe Bay a Fairbanks. No caminho, só Toolik (que não dá acesso a lugar nenhum, é completamente isolada), umas estações de bombeamento de petróleo, a Cordilheira de Brooks, o Círculo Polar Ártico e nada mais.
“Qual é a temperatura média durante o tempo que permanece claro? É possível chegar no centro exato do pólo?” (Josias Vieira Muller)
A temperatura varia, em média, de 5ºC a 25ºC no verão, mas pode mudar de uma hora para outra. Tivemos dias muito frios, por volta de 0ºC, e muito quentes, quase chegando aos 30ºC, nessas duas semanas. Pesquisadores já chegaram ao pólo, sim. Mas dá um trabalhão.
Para terminar o registro desta passagem pelo Alasca, nada melhor que uma imagem da Estação de Pesquisas de Toolik Lake, nosso lar nessas duas semanas.
É isso pessoal, ficamos por aqui. Você que gosta de acompanhar as novidades da ciência e notícias sobre o meio ambiente, fique ligado na nossa página de Ciência, clicando aqui.
Vejo vocês semana que vem, no G1!
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca10 de Julho de 2008 às 09:51
G1 flagra o Sol da meia-noite no Alasca
Diversos leitores perguntaram nos comentários sobre o Sol da meia-noite e a aurora boreal. Aqui no Alasca é possível ver os dois fenômenos – mas não na mesma época. Para a aurora boreal poder ser vista é preciso estar escuro, o que não ocorre agora, durante o verão. Mas o Sol da meia-noite, este sim, estou vendo de perto. Todos os dias.
Esse fenômeno acontece porque estamos acima do Círculo Polar Ártico, que é a linha que marca o ponto extremo do “dia polar” e da “noite polar”. Se o planeta não tivesse motanhas, seria bem em cima dessa linha que o Sol encostaria, sem se pôr, no dia 21 de junho, solstício de verão no Hemisfério Norte (no Brasil, a data marca o início do inverno). O Sol da meia-noite também acontece no pólo Sul, na região abaixo do Círculo Polar Antártico, a partir do dia 21 de dezembro.
Isso acontece porque a Terra é um pouco inclinada em relação ao Sol. Durante o verão no hemisfério Norte, o pólo fica apontado para o Sol enquanto o hemisfério Sul enfrenta seus meses de escuridão. Seis meses depois, a coisa se inverte.
Passar tanto tempo sem ver a noite é uma experiência esquisita. O corpo demora a aceitar e o seu relógio biológico fica meio amalucado. É preciso confiar nos ponteiros dos relógios para saber a hora de ir para cama. A sensação é estranha. Você sabe que é hora de dormir, mas seu corpo sente como se fosse manhã de novo.
Quem mora na região já se acostumou. Mas os recém-chegados e turistas sofrem um pouco. Para dormir, valem todos os truques. Há quem tape as janelas com cortinas espessas, lençóis ou o que tiver pelo caminho (eu e minhas colegas de barraca tapamos a entrada do sol com nossos casacos de inverno). Um acessório bastante comum é aquela máscara para dormir, que muita gente usa em aviões. Outra saída, principalmente para quem está acampando como nós, é se fechar no saco de dormir. No começo, no entanto, quase tudo parece ineficaz. As primeiras noites são bem difíceis. E, lógico, pessoas que têm tendência a insônia sofrem mais.
Para os moradores locais, no entanto, é mais tranqüilo. O dia eterno é uma desculpa para esticar tanto o trabalho quanto o lazer. Aqui na Estação de Pesquisas de Toolik Lake, os estudos começam cedo, por volta das 7h, e é possível ver pesquisadores em seus laboratórios até 1h ou 2h da madrugada. Nas cidades, com a ausência de escuridão, nada impede quem quer dar um passeio com o cachorro, exercitar-se ou simplesmente dar uma voltinha tarde da noite.
O fenômeno inverso, a noite de 24 horas, é um pouco mais duro de agüentar – principalmente porque vem acompanhado do frio intenso. Em um dos vôos para chegar aqui, conheci um soldado da Força Aérea americana que trabalha em uma base no Alasca. Ele mostrou um vídeo no celular feito por colegas durante a noite eterna do Ártico. Ele segura um copo com água. Joga para cima e o líquido congela instantaneamente.
Marie Gilbert, assessora de impresa da Universidade do Alasca em Fairbanks, conta que o ponto de encontro no inverno é o supermercado. Sempre que é possível, todo mundo corre para lá para comprar comida suficiente caso a neve impeça que as pessoas saiam de casa por um certo tempo. Carros ficam na garagem e todo mundo vai trabalhar de esquí ou de trenô. E para evitar a depressão que se espera de pessoas que vivem tanto tempo sem luz, a cidade organiza eventos esportivos de inverno para manter todo mundo animado – e um pouco mais aquecido.
Você tem alguma outra dúvida como essa? Agora é a chance de perguntar. Nossa aventura está em seus momentos finais.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca09 de Julho de 2008 às 11:02
Terra gelada em chamas
Vocês se lembram do nosso encontro com os ursos, que eu mencionei aqui no post passado, não? O segundo ocorreu durante uma viagem de helicóptero que fizemos para conhecer toda a área que foi queimada durante um incêndio provocado por um raio em 2007.
Você lê mais sobre isso, no G1, clicando aqui.
A visão da tundra queimada é chocante, vista do alto. Até o horizonte, a vegetação é marcada pelo tom escuro. Em volta de riachos, rios e lagoas, no entanto, o fogo não chegou. O que forma uma paisagem quase surreal de verde brilhante lado a lado da mata queimada.
Uma vez no chão, a coisa fica ainda mais impressionante. Um ano depois do incêndio, o solo é coberto por cinzas que não voam com o vento. Cada passo dado libera uma nuvem de pó negro, uma lembrança do estrago feito na paisagem intocada do Ártico.
O que mais chama a atenção, no entanto, é a vida que ressurge – mesmo depois de três meses queimando e todo um ano sob o gelo. Devagar, pequenos tufos verdes começam a surgir na tundra. Espécies menores, mais devastadas, já não existem mais. Mas aqui e ali, uma delas começa a aparecer, uma raridade que surge das poucas sementes que sobreviveram as chamas.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, nos EUA
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Ciência, G1 no Alasca08 de Julho de 2008 às 09:27
Contatos nem tão imediatos assim com o maior predador do Ártico
Em menos de 24 horas, o grupo de jornalistas que está na Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca, por duas vezes chegou o mais perto que gostaria do maior predador da região: o urso-pardo.
O primeiro “encontro” ocorreu no final da tarde do domingo. Caminhando ao longo do rio Atigun, na cadeia de montanhas de Brooks, os pesquisadores Linda Deegan e Chris Neill chamaram nossa atenção. Era uma pegada de urso, bem nítida, na beira do rio. “Isso é provavelmente o mais perto que vamos chegar de um desses”, disse Chris.
Poucos metros depois, outra pegada. Muito provavelmente do mesmo bicho. Como estávamos em um grupo grande, com 13 pessoas, não houve motivo para preocupação. Ursos costumam passar longe de grandes “manadas” de gente. A única orientação foi para que ninguém se distanciasse muito. Urso faminto e pessoa sozinha é uma combinação perigosa, e as pegadas que vimos eram frescas o suficiente para concluirmos que o animal ainda estava por perto.
No dia seguinte, segunda-feira, pela manhã, eu e meu colega Jason Orfanon, do canal National Geographic, fomos convidados por Chris Neill para conhecer, entre outras coisas (e essa parte da história você ficará sabendo aqui no G1 em breve!), um equipamento colocado à beira do lago Dipple, a alguns quilômetros do nosso acampamento.
Qual não foi nossa surpresa ao chegar no local e ver tudo completamente destruído. O painel solar derrubado, a mangueira que retira amostras da água totalmente mastigada e uma caixa que guardava a bateria do aparelho destroçada e cheia de marcas de mordida.
O equipamento é grande e pesado. As marcas de mordida são compatíveis. E lá foi Chris, de novo, anunciar: “É, um urso passou por aqui”. Nossa suposição é que o bicho tenha pensado que havia comida dentro da caixa — que é do mesmo tipo que muita gente usa em piqueniques e acampamentos.
No local, a mata é um pouco mais alta e densa. “Ele pode estar aqui do lado e nós jamais ficaríamos sabendo”, disse Chris. Mas, dessa vez, também, não nos preocupamos muito, porque chegamos ali de helicóptero. E ursos, quando vêem o monstrengo metálico se aproximando, costumam fazer a mesma coisa que eu faria se visse um exemplar da espécie: sair de fininho para não ser percebido e daí correr — correr MUITO!
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca07 de Julho de 2008 às 10:06
Rumo ao Oceano Ártico, uma cidade estranha e vida selvagem
Um dos pontos turísticos mais procurados aqui no Ártico é provavelmente o de mais difícil acesso: o oceano. O único meio de chegar ao mar nesta região do Alasca onde estamos fica na cidade de Prudhoe Bay, onde também fica uma enorme reserva de petróleo que abastece toda o estado. O acesso é fechado ao público. Para visitar é preciso pagar uma bagatela de US$ 40 para uma companhia de turismo que detém a exclusividade dos passeios por ali. Também é preciso apresentar documentos para que o governo americano confira se você não é procurado por alguma coisa – o medo é que terroristas tentem atacar uma das principais fontes de energia do país.
Quem paga os doláres e passa na checagem vai encarar o que provavelmente vai ser o passeio mais bizarro de toda a sua vida. O guia mostra as “atrações” de Prudhoe Bay, uma cidade 100% industrial e dedicada ao petróleo, onde ninguém mora (os funcionários das companhias fazem turnos de duas semanas apenas e depois voltam para suas casas – o medo é que as pessoas pirem num lugar sem absolutamente nada para fazer além de trabalhar que fica congelado 80% do ano). Durante o tour, você ouve coisas inacreditáveis como “aqui à direita, você vê uma borracharia”. É. Assim mesmo. Não é à toa que um dos adesivos de carro mais vendidos (na única loja que serve a cidade) é: “Se você não acha que o inferno congela, você nunca foi a Prudhoe Bay”.
É claro que o ponto alto do passeio não são as torres de petróleo nem os escritórios estéreis das companhias: é o oceano – e ele até compensa a bizarrice da cidade. Quando você chega ali, pode ficar por meia hora e, se for corajoso o suficiente, nadar na água gelada (e suja) – é preciso ignorar a massa de gelo visível no horizonte, no entanto. Isso se você não tiver o azar de estar num dia de neblina – nesse caso, ninguém pode sair do ônibus, porque ursos polares podem se esconder e atacar.
Tivemos a sorte de não encontrar nenhum urso (que são bichos fofinhos só em fotografias; por aqui eles são predadores temíveis e não há um morador da região que não conheça uma história de um ataque para contar), mas também tivemos a grande sorte de ver outros bichos típicos do Ártico vivendo livres na natureza em nosso passeio.
O primeiro foi um caribu, nome dado às renas que vivem na América do Norte:
Depois, uma grande manada selvagem de bois-almiscarados, que passaram bem pertinho do nosso grupo:
E enfim, na viagem de volta ao centro de pesquisas, flagramos ao longe um grupo de ovelhas desafiando a gravidade em uma encosta. Não dá para ver direito na foto, porque elas estavam bem longe. Mas, acreditem, são ovelhas. Cientistas especializados garantiram.
Se Prudhoe Bay é esquisita, a viagem, com certeza, compensa.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca07 de Julho de 2008 às 10:00
Conferência dos repórteres de ciência
Depois de uma semana “brincando” (ok, o termo é injusto, porque o trabalho foi duro!) de ser cientista, o grupo de jornalistas que visita a Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca, apresentou no final de semana seus resultados.
E apresentou como pesquisadores de verdade: em um simpósio, com a ilustre participação dos cientistas que estão aqui trabalhando a campo. Gente para lá de entendida em suas áreas, que não teve dó nem piedade ao testar o conhecimento dos repórteres. Mas todos foram extremamente simpáticos e também não pouparam esclarecimentos e ensinamentos durante o nosso encontro.
“Somos todos professores também”, esclareceu John O’Brien, um dos principais e mais antigos pesquisadores aqui de Toolik, quando perguntei sobre a infinita paciência deles com a gente. O’Brien é parte do grupo original da estação de pesquisas, chegou aqui em 1975, quando, segundo suas próprias palavras, “não havia nada mais que meia dúzia de barracas, nada de cozinha, nada de banheiro e ursos por toda parte”.
Na nossa apresentação, divididos em cinco grupos, mostramos nossos resultados sobre: as trocas de carbono no ecossistema ártico, as conseqüências do aumento de arbustos na região, o efeito do excesso de nutrientes nos rios, os resultados da poluição dos rios e o que acontece quando o solo congelado do Ártico (chamado de permafrost) derrete. Eu e meu colega Richard Morgan, do New York Times, ficamos responsáveis pela penúltima apresentação, sobre os lagos.
Todos os resultados mostraram que o aquecimento global já é uma realidade no Ártico e está mudando a paisagem da região às nossas vistas. O derretimento dos solos congelados está aumentando nitidamente. O excesso de nutrientes e a poluição dos rios está mudando todo o ecossistema, acelerando o crescimento de musgos e alterando a diversidade de espécies animais e vegetais. A mesma coisa acontece quando mais carbono é liberado na tundra: as plantas que se adaptam melhor se espalham, enquanto as outras perecem. Nesses casos, quem se dá bem são os arbustos, que fazem sombra para as plantas menores e alteram todo o delicado equilíbrio da região.
Parte científica terminada, nós partimos agora para a segunda parte da aventura: conhecer o que os cientistas de verdade estão fazendo por aqui. Para saber mais, fique de olho aqui no G1.
Marília Juste*
* A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca06 de Julho de 2008 às 07:33
O ataque dos mosquitos do Ártico
Diversos leitores que acompanham esse blog manifestaram dúvidas sobre a quantidade de mosquitos que existem aqui no Alasca. É perfeitamente compreensível. A gente que vive em um país tropical está acostumado com esses insetos chatos que surgem nos meses mais quentes, principalmente no campo. Logo, parece meio irreal imaginar algo do tipo em um lugar tão frio quanto o Ártico.
Mas, acreditem, eles estão por aqui – e em bando. E deixariam os pernilongos e borrachudos do litoral brasileiro comendo poeira. Primeiro, porque a quantidade é imensa. Imensa. Imensa. Imagine uma enorme quantidade de mosquitos e daí multiplique por três. É por aí.
Não acredita? Veja você mesmo:
Como não anoitece, os mosquitos estão 100% do tempo com a gente. E é 100% do tempo mesmo, porque não esqueçam, estamos em um acampamento. Redes nas portas dos laboratórios e das barracas tentam segurar a entrada dos bichos. Elas e os repelentes são nossa única defesa.
Apenas repelentes a base de “deet” (a dietiltoluamida) servem. Parece propaganda, mas é efeito prático. Velas aromáticas só servem para aumentar o risco de incêndio. Segredos da vovó, como amarrar um saco plástico cheio de água na porta? Não fazem nem cosquinha. Nem a chuva, nem a neve afastam os mosquitos. Tivemos a ‘feliz’ oportunidade de tomar a chuva gelada do Alasca em diversas oportunidades e em todas elas os mosquitos estiveram ali, a postos, ao nosso lado.
Só o repelente parece ter algum efeito – e, honestamente, nem é um efeito tão grande assim. É fácil identificar os novos moradores de Toolik Lake e quem já está aqui faz tempo. Os novatos, como nós, estão o tempo inteiro balançando os braços, com redes na cabeça (alguns, como redes que cobrem o corpo todo, um macacão feito de rede anti-mosquito) e passando repelente de dez em dez minutos. Os mais experientes já se acostumaram e mal reparam na existência deles. São capazes de dar aulas inteiras com insetos no rosto. Seu único movimento anti-mosquito é, de vez em quando, tirar um mais atrevido que entra no nariz, na orelha ou na boca.
Marília Juste**A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca05 de Julho de 2008 às 06:53
Raro fenômeno solar no topo da montanha
O que você faz depois de um dia duro de trabalho, por volta das 21h, para relaxar? Bom, se você está na Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca, você escala uma montanha.
A escalada é o passatempo número um de quem está passando o verão no centro de estudos. Não é de todo surpreendente. Só há uma TV no acampamento (e depois de uma semana ainda não encontrei ninguém que saiba exatamente onde ela fica – ninguém se preocupa muito com isso) e depois de um dia de rigor intelectual, a última coisa que eles querem ver na frente é um computador ou um livro.
Outro fato é a absoluta falta de privacidade que existe no acampamento – barracas, banheiros e a cozinha são todos coletivos. As pessoas só ficam 100% sozinhas quando estão usando o toalete reservado. Isso tudo somado ao fato de que o horário não é um problema, porque não anoteice nunca, as caminhadas sobre as montanhas se tornaram o passatempo favorito – para relaxar e para se afastar um pouco da agitação em volta do lago Toolik.
Quem vai sair, no entanto, precisa avisar onde vai, quantas pessoas estarão junto e que horas pretende voltar. É muito fácil se perder na tundra e a administração do acampamento precisa saber quando deve partir em busca de alguém que não achou o rumo de volta.
Em uma dessas noites de sol, o grupo de jornalistas que está conhecendo a vida na estação fez uma leve caminhada de duas horas, logo após o jantar. Subimos ao topo da Jade Mountain procurando um ninho de um falcão peregrino, que disseram que havia por ali. Não encontramos a ave, mas conseguimos imagens fascinantes da área.
O melhor do passeio, no entanto, aconteceu no finalzinho. Tivemos a grande sorte de ver um belo fenômeno solar que tem um nome meio esquisito, “parélio”. É esse arco que surge completo em volta do sol.
Um belo final de dia — apesar do “dia” nunca de fato acabar por aqui.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca04 de Julho de 2008 às 08:50
Dia de químicos
Vocês lembram daqueles dias passados na chuva coletando amostras nos rios dos arredores da Estação de Pesquisas de Toolik Lake? Pois todas as tais amostras foram levadas ao laboratório para análise. E pergunte se choveu uma só gotinha o dia inteiro? Nada. Só porque estávamos com um teto sobre nossas cabeças, nadinha de chuva.
Mas tudo bem, porque se não teve chuva, teve vento. E quando há vento, não há mosquitos — ou pelo menos há menos mosquitos. Um alívio mais do que bem recebido.
Sob a tutela do sempre presente Rich McHorney, os jornalistas que estão no Alasca foram para o laboratório descobrir as concentrações de potássio e nitrogênio nas amostras que coletamos.
O trabalho é simples para caras como o Rich, e basicamente para qualquer biólogo ou químico, mas para a gente foi um pequeno desafio organizar todas as amostras e reagentes, e organizar os resultados. Quando a coisa era mais complexa (por exemplo, quando envolvia um equipamento delicado demais), tivemos que nos contentar em voltar à posição de espectadores — logo agora que estamos pegando gosto por essa coisa de ser cientista! Mas valeu a pena.
Os resultados finais serão apresentados no próximo sábado, onde os dez jornalistas vão ser o centro das atenções de uma miniconferência científica. Com a cara e a coragem vamos apresentar nossos estudos e conclusões para os pesquisadores de verdade. E vamos ter que responder as perguntas deles. Se estamos com medo de fazer feio? Muito! Por isso, cada minuto livre desses dias está sendo dedicado a análises, revisões e a montagem de gráficos para nossas palestras.
O resultado de tudo isso você confere aqui no G1. Fique ligado!
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca04 de Julho de 2008 às 08:49
Música baiana invade o Alasca
Ao fundo, montanhas cobertas de neve. Ao redor, a vegetação rasteira típica do Ártico. Por todo o lugar, cientistas carregando equipamentos para lá e para cá. Nas caixas de som?
Música baiana.
O axé invadiu a noite ensolarada da Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca. Mas a história é comprida, então vamos por partes.
Tudo começou quando os pesquisadores descobriram que um de seus alunos era de Porto Rico. Logo, a ciência foi deixada de lado um pouquinho para um momento de lazer e o porto-riquenho Joel Mercado foi destacado para ensinar todo mundo a dançar salsa.
Um, dois, três, um, dois, três e o paciente Joel foi ensinando, um a um, os gringos a rebolarem ao som da música latina. Mais tarde, ele me confessou que se surpreendeu com o rebolado dos cientistas. “Eu achei que eles iam ficar todos duros, mas foram muito bem! Foi muito divertido!!”, contou o barbudo que você vê nas fotos.
Tudo ia muito bem até a representante do Brasil, esta que vos fala, adentrar o recinto. Não surpreendentemente, os americanos logo quiseram transformar a aula de salsa em aula de samba. Em questão de segundos, uma americana apareceu carregando um CD na mão como se fosse um trófeu. Ali, escrito à mão, estava: “Brazilian music”.
Já bastante chocada com a mera existência do CD (vale lembrar que Toolik Lake está acima do Círculo Polar Ártico, a uma viagem de nada menos que 11 horas de carro da cidade mais próxima), qual não foi minha surpresa ao ouvir sair daquelas caixinhas: ‘Tudo começou há um tempo atrás, na ilha do soooool…”.
Ao som de Netinho e seu ‘ôôô Miiiiila’, os gringos fizeram a festa. Logo em seguida vieram outros sucessos da música baiana, com Chiclete com Banana e Daniela Mercury. Foi difícil explicar para eles que aquilo não era samba, mas todos acabaram se conformando com alguns passinhos ao som de um CD do Sérgio Mendes de outra pesquisadora. E se você pensa que era só isso que tinha por lá, se engana. Buscando a coleção de CDs dos cientistas encontrei até uma muito bem preservada coletânea de forrós. “Sao Joao’s bonfires”!
Acredito que tenha sido o mais ao norte no planeta que o axé baiano já chegou. Desbravando fronteiras!
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca03 de Julho de 2008 às 09:14
Quando o solo explode
O que acontece quando alguém puxa o seu tapete (no sentido literal da coisa)? Você desaba. Por quê? Porque perde a sua sustentação. Uma coisa parecida acontece na natureza no ambiente ártico e foi isso que o grupo de jornalistas que visita a Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca, foi conhecer.
Como já explicamos em um dos primeiros posts desta viagem, o solo por aqui é congelado, rico em matéria orgânica e dióxido de carbono. Esse chão congelado é chamado de “permafrost”; em alguns locais está a poucos centímetros da superfície, em outros, a muitos metros. Quando alguma coisa acontece e a temperatura sobe por algum motivo, o permafrost pode derreter. Se isso ocorre, é como se o tapete fosse puxado: o solo desaba.
Essas áreas onde o chão entra em colapso são chamadas de “termocarste”. Fomos visitar uma nas proximidades do acampamento.
Há apenas cinco anos todo esse buraco era só uma parte mais baixa do terreno. De repente, surgiu um buraco. E de lá para cá, ele só tem aumentado.
Os cientistas estão muito interessados nesse fenômeno, porque têm a impressão de que ele está ocorrendo com maior freqüência nos últimos anos – é o que afirma a pesquisadora Linda Deegan, do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, nos Estados Unidos, que ajuda a nos orientar aqui no Alasca.
Para colaborar com o trabalho, nós retiramos amostras dos nutrientes e calculamos a elevação do terreno.
A hipótese, é claro, é que isso tenha a ver com o aquecimento global. Mas ainda há muito a se estudar para ter certeza disso, a cientista explicou para a gente.
Se você se interessou pelo assunto, fique ligado aqui no G1. Teremos novidades em breve!
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca03 de Julho de 2008 às 09:11
Pegadas na tundra
No caminho de volta de nossa visita ao thermokarst, Linda Deegan nos deu um presentinho.
Em suas andanças pela tundra ela encontrou uma trilha que os alces fizeram. Ela marcou duas pegadas:
Não dá para ver muita coisa na imagem, mas no meio da tundra dava para ver direitinho por onde eles passaram.
Os alces são bastante comuns na área, assim como as renas (conhecidas como “caribus” por aqui). Tanto que os cientistas precisam proteger seus experimentos para que eles não virem almoço. Até agora, no entanto, ainda não tivemos a sorte de dar de cara com nenhum dos dois.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca02 de Julho de 2008 às 09:29
Pesquisa animal (e gelada)
Dia gelado na Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca. O sol, que nunca se põe, nem deu as caras, permaneceu o tempo todo escondido atrás de feiosas nuvens de chuva. E tome chuva.
Pelo segundo dia seguido, muita água gelada caiu sobre as cabeças da equipe de jornalistas que está no centro de pesquisas para descobrir, na prática, como trabalham os cientistas que estudam as mudanças climáticas.
Esse tempo é típico desta região nesta época do ano, explicou o coordenador do curso, Chris Neill. Por isso, todo mundo teve de voltar para os rios gelados do Ártico para trabalhar. “Se estivesse realmente muito forte, não poderíamos continuar. Mas apenas chovendo, não dá, temos que seguir com a retirada de amostras”, disse ele.
Logo, dez jornalistas completamente ensopados e morrendo de frio encararam o rio Kuparuk, típico da tundra, onde pesquisadores da estação conduzem um experimento desde 1984 para estudar os efeitos do excesso de nutrientes na água – o que é uma conseqüência do aumento da atividade humana por perto.
Coletamos amostras de nutrientes e da água e calculamos a velocidade do fluxo, como no dia anterior. E tivemos a oportunidade de ver Linda Deegan, que coordena todo esse trabalho, em ação. Ela nos mostrou como os pesquisadores fazem para rastrear os peixes que vivem por ali.
Depois que o animal é capturado, ele é colocado em um balde com anestésico, que o deixa sonolento. Quem se preocupa com o bem estar animal pode ficar tranquilo. É visível o efeito da medicação. O peixe vai nadando cada vez mais devagar, até parar e ficar meio de lado – quase como se estivesse dormindo.
Linda, então, pega uma seringa e insere um chip dentro da cavidade do corpo do animal – em um lugar que não faz mal para ele e que não corre risco de ser comido por uma pessoa, caso ele seja pescado e acabe na mesa de alguém.
Logo em seguida, o peixe é devolvido à água. Quando o trabalho é feito com muitos peixes, eles são colocados em uma área protegida até o efeito do anestésico passar – para evitar o ataque das aves predadoras. Assim que ele volta ao normal, volta a nadar tranqüilamente até ser contabilizado na pesquisa no ano seguinte.
Depois de muita, muita água e muito, muito frio, voltamos para a estação. E, é claro, como seria esperado, a chuva imediatamente parou.
No laboratório, foi a hora de separar, observar no microscópio e contabilizar todas as espécies em todas as amostras. Para isso, contamos com a ajuda de outro especialista de Toolik, Alex Hyrun, que nos ensinou a identificar cada um desses bichinhos microscópicos, mas fascinantes.
Esse trabalho foi uma das partes mais interessantes do curso até agora. É incrível a diversidade de espécies que podem existir em um ambiente tão inóspito.
É mais material para a nossa grande apresentação de sábado.
Para conferir o resultado de tudo isso, fique de olho no G1.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca02 de Julho de 2008 às 09:22
Comida de cientista
Alguns posts atrás, o leitor Marcelo Duque Estrada perguntou o que se come na Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca, onde um grupo de jornalistas está para mostrar na prática como é feita a pesquisa sobre o aquecimento global.
Essa é uma pergunta muito interessante, porque é a primeira coisa que todas as pessoas pensam quando descobrem que virão para cá: “Mas o que é que eu vou comer?”
Felizmente, no entanto, comida é com certeza o menor dos problemas por aqui. A estação tem uma equipe dedicada de cozinheiros que oferecem três refeições completas por dia. O café da manhã, das 7h30 às 8h30, é no estilo americano, cheio de ovos e bacon – logo, é para lá de bem servido. Ainda assim, todo domingo há um café continental, com mais opções ainda.
O almoço é servido entre 12h e 13h; o jantar entre 18h e 19h. O cardápio é variado e não há controle de porções – você pode comer o quanto quiser ou agüentar. Diariamente, há cookies feitos 100% no local – um mais gostoso que o outro.
Em dias especiais, há cardápios especiais. No próximo feriado de 4 de julho, Dia da Independência dos Estados Unidos, por exemplo, o cardápio do jantar é filé mignon e lagosta – nada mal, não é?
Os vegetarianos tem diariamente um cardápio feito especialmente para eles. Tudo que precisam fazer é colocar seu nome em uma lista, para controle dos cozinheiros.
O mesmo acontece com pessoas com alguma alergia alimentar ou com problemas específicos com comida. A equipe de Toolik deixa claro que está disponível para deixar a estadia de qualquer pessoa mais gostosa, pelo menos no departamento culinário.
E, se tudo isso ainda não for suficiente, a cozinha tem todo um suprimento de bolachas, salgadinhos, frutas, sorvetes, sucos, sanduíches, cereais e até balas, chocolates e pirulitos. Tudo livre para qualquer pessoa pegar a vontade.
Há também uma máquina de café – mas é café americano, nada que se compare ao bom e velho cafezinho brasileiro.
Quando alguém não vai estar presente para alguma refeição é preciso avisar a cozinha. Nesses casos, as pessoas fazem sanduíches ou qualquer outro lanchinho e levam para comer enquanto trabalham. Foi exatamente isso que aconteceu com a turma de jornalistas em uma das saídas para trabalho nos rios. Empacotamos o almoço e fomos comer ao ar livre.
Infelizmente, no entanto, estava chovendo. E muito.
Um ônibus de turismo até parou na estrada quando nos viu sentadinhos no meio da tundra comendo nossos lanches debaixo do aguaceiro. Até dava para imaginar o guia: “Olhem só, que bando de idiotas, comendo no meio da chuva e dos mosquitos!”
Porque, não, os mosquitos nunca nos abandonam. Nem mesmo na chuva. Mais sobre isso nos próximos posts.
Bom, Marcelo, é isso! Espero que tenha respondido a sua pergunta!
E vocês, demais leitores, têm alguma pergunta sobre a vida dos cientistas no Alasca? É só deixar nos comentários que vamos tentar responder!
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca01 de Julho de 2008 às 09:23
Depois da chuva gelada, um presente gelado
O que você gostaria depois de passar um dia inteirinho trabalhando dentro de um rio gelado e sob uma chuva mais gelada ainda? Um banho quente? Um cobertor macio?
Bom, o grupo de jornalistas que está na Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca, ganhou outra coisa: uma visita a uma… a um… hmmm, bem é aí que fica complicado. Veja abaixo.
“Uma geleira!”, deve ser o que você pensou. Bom, foi o que eu pensei também. E foi o que todo mundo no grupo pensou. Mas nos foi martelado na cabeça durante todo o caminho pelos nossos guias/professores, Chris Neill e Rich McHorney: “Não é uma geleira!!!!!”
O que visitamos na verdade é chamado de “auf eis”, que, em alemão, significa “gelo por cima”. Ele surge a partir de um lençol freático. A água que vem de baixo, que é sempre aquecida pelo calor do interior da terra, congela assim que entra em contato com o ar gelado. A corrente líquida nunca pára, porque é pressionada para cima. E o gelo é tanto que demora para derreter mesmo no alto verão.
Tudo isso gera uma visão que é deslumbrante. No meio do verão, a enorme camada de gelo cobre a tundra sob as montanhas, dando um brilho azul meio sobrenatural a tudo.
O gelo derretido forma pequenas cachoeiras e piscinas, cercadas por pedras que estão por ali há milhões de anos.
Quem quiser se dedicar a olhar pedras em vez de gelo, pode dar a sorte de encontrar pequenas pedrinhas de jade – que é bastante comum por ali.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca01 de Julho de 2008 às 09:21
Ciência molhada
Se o primeiro dia foi de frio e o segundo foi de sol, o que esperar do terceiro? Se você respondeu chuva, acertou. Muuuita chuva na região da Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca, onde um grupo de jornalistas aprende os desafios e os prazeres da ciência de campo.
Mas cientistas de verdade não se abalam com as condições climáticas. Mesmo com a chuva gelada e ininterrupta fomos todos para dentro de três rios locais recolher nossas amostras.
Essa roupinha aí em cima não é nada atraente, mas todo mundo gostou. Ela é feita do mesmo material das roupas para surfistas. Evitam que o corpo se molhe e protegem contra o frio. Não tínhamos para todo mundo, no entanto, então tivemos que trabalhar em turnos. Mas não se preocupe, ninguém ficou sem se jogar na água fria.
Nosso objetivo era descobrir como as águas geladas do Ártico vão se comportar se as temperaturas globais subirem demais. Para isso, recolhemos amostras de água, de minerais, de nutrientes e de pequenos artrópodes que vivem nesses locais.
Todos os três rios que visitamos só existem durante o verão no Hemisfério Norte e são feitos a partir de neve derretida – parte vinda do solo local, parte das montanhas. Os fluxos que vêem das geleiras nas montanhas, como esse aí de baixo, estão entre os mais interessantes, porque quando descem arrastam tudo pelo caminho. E as menores substâncias que ficam presas nessa água podem ir longe, muito longe, afetando ecossistemas inteiros.
Além das amostras, nós também medimos a profundidade e a velocidade desses rios. Para isso, contamos com a ajuda de um equipamento eletrônico – que ajudou, mas não aliviou em nada o fato de que foi preciso estar dentro de uma corredeira de água gelada para fazer as medições.
O objetivo aqui era ver se o aquecimento global já está dando as caras e diminuindo ou aumentando a quantidade de água e a força desses rios.
Esses resultados devem aparecem nos próximos dias, quando nossas amostras forem para o laboratório para uma detalhada análise química.
Depois do dia inteiro dentro e sob a água gelada, tivemos um recompensa – e que recompensa!!
Mas isso você só vai ficar sabendo no próximo post!
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca30 de Junho de 2008 às 17:57
Como lidar com o lixo no fim do mundo
A 11 horas de distância da cidade mais próxima, a Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca, tem um desafio imenso: o que fazer com o lixo?
Os cientistas que estão por aqui estão pesquisando, na maioria dos casos, o que a atividade humana fez de mal ao meio ambiente. Parece lógico, portanto, que eles procurem minimizar ao máximo o próprio impacto no local.
Nenhum resíduo criado na estação é deixado no ecossistema. Toda a água usada e suja é recolhida e levada em tanques até estações de tratamento. O mesmo acontece com o esgoto. Para não causar nenhum dano ao ambiente, não há banheiros com descargas. Os sanitários são fossas e chamados de “torres” porque ficam em casinhas construídas no alto sobre tanques que guardam os dejetos. Tudo, como a água, é levado para tratamento em uma área que não prejudique o ecossistema.
Lixo queimável, como papel e resto de comida, é queimado. Latinhas e vidros são recicladas. Banhos são reguladíssimos – dois por semana por dois minutos no máximo (não há um vigia na porta do banheiro, é claro, mas todos contam com a cooperação e o bom senso para manter tudo funcionando). Máquinas para lavar roupa são permitidas – mas só uma lavagem por semana - logo é comum todo mundo andar com roupas imundas sem qualquer preocupação. Há pias para lavar mão e rosto e para escovar os dentes, e todo mundo tenta deixar as torneiras abertas o mínimo possível.
Apesar do grande número de pessoas por aqui no verão (semana passada havia 123 pesquisadores acampando), tudo realmente funciona direitinho.
Uma lição de vida para quem se preocupa com o planeta.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca30 de Junho de 2008 às 17:06
O mistério das colheres desaparecidas no Alasca
Um mistério toma conta da cozinha da Estação de Pesquisas de Toolik Lake: onde foram parar TODAS as colheres?
(Em português: “Procura-se colher. Limpa ou suja. Nenhuma pergunta será feita”)
De alguma maneira, a bem equipada cozinha se viu sem nenhuma, nenhumazinha das dezenas de colheres que existiam no campo. O gerente do acampamento, Chad Diesinger, afirmou que acredita que as pessoas acham que elas são um bom souvenir para levar para casa.
Bom, é mais barato que os cartões postais de US$ 2.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca30 de Junho de 2008 às 16:28
Download ilegal é crime mesmo nos lugares mais isolados
Não há telefone na Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca, mas há internet wireless de alta velocidade por todo o acampamento. Internet que é para ser única e exclusivamente usada para trabalho e estritamente monitorada.
Alguém, no entanto, resolveu desafiar as regras e baixar arquivos na internet.
Não demorou para o alerta ser postado:
Traduzindo: “A distribuição de músicas/filmes é ilegal. Se você tem um Mac e estava baixando Entourage [um seriado americano] hoje, PARE, o Grande Irmão está de olho.”
Medo.
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
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Ciência, G1 no Alasca30 de Junho de 2008 às 10:26
Bang-bang científico no Alasca
Segundo dia de estudos de campo para o grupo de jornalistas que visita a Estação de Pesquisas de Toolik Lake, no Alasca. Dessa vez, o tempo colaborou e em vez de o vento polar que enfrentamos no começo, o sempre presente sol castigou nossas cabeças durante todo o dia.
As variações de temperatura aqui são violentas e ocorrem de uma hora para outra. O lago que dá nome ao acampamento, aí embaixo, estava completamente congelado há menos de duas semanas.
E se o primeiro dia começou prometendo tempo estável e acabou todo fechado, frio (por volta dos 5°C) e com muito, muito vento, o segundo iniciou de cara feia, mas abriu em poucas horas para um céu azul e sem nuvens. A temperatura real não está muito alta, gira em torno de uns 10°C, mas a sensação dentro das barracas de plástico que receberam sol o dia todo é bem mais confortável – ainda bem, porque o frio de ontem não estava fácil de encarar para quem veio dos trópicos.
De volta ao trabalho, nossa missão agora era desvendar o efeito no solo do aumento dos arbustos no ártico. Essa, novamente, é mais uma das prováveis conseqüências do aquecimento global.
Para isso, caminhamos para uma área mais distante da estação: o pedaço de solo mais seco por ali. O local era completamente diferente do que visitamos no primeiro dia, mas o trabalho era bastante parecido: retirar repetidas vezes dados como temperatura do solo, altura do permafrost, características das espécies de duas amostras de terreno, uma deixada para crescer naturalmente e outra alterada com nutrientes para simular os efeitos do calor excessivo.
Novamente ao lado de Christine Dell’Amore, minha missão foi calcular a temperatura do solo nas duas áreas. Para isso, contamos com um brinquedinho bastante divertido – na verdade, um precioso equipamento de pesquisa científica, fomos logo corrigidas por nosso coordenador, Rich McHorney. Nosso termômetro parece mais um revólver: basta apontar, mirar e apertar o gatilho para ter a temperatura exata do lugar em vista.
O alcance é infinito. Rich apontou para uma geleira próxima e mostrou a temperatura: 0°C. Para o céu, -15°C.
Foi ele mostrar e um pensamento pulou na minha cabeça na hora. Rich parece ter lido minha mente. Devolveu o aparelho e mandou: “Não aponte para o sol”.
Droga.
Nossos resultados mostraram que a temperatura do solo na área afetada pelo aquecimento global de mentirinha varia muito: de 13°C a 42°C. Na amostra de controle, a variação foi bem menor. É mais uma informação a ser coletada para nossa apresentação final, que agora já tem data: sábado, 5 julho.
Amanhã, o trabalho vai ser bem diferente – e gelado. Vamos trabalhar em um rio feito de permafrost derretido. E quando digo “em um” é literalmente “em um”, é “dentro” do rio. Para saber nossos resultados (científicos e de saúde), fique ligado neste blog. Até a próxima!
Marília Juste*
*A repórter viajou a convite do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole, EUA
terça-feira, 2 de setembro de 2008
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